Condição docente e blogosfera
Porque é que muitos docentes por esse mundo fora utilizam a blogosfera para reflectirem sobre a sua condição? Algumas explicações:
- Não é tradição entre os professores falar-se de emoções em contexto profissional: tradicionalmente, um professor é um racionalista, um especialista (Britzman, 1986, 1991), um contexto semiótico em que o self, o sentimento de si, não tem, na tradicioção racionalista que giza a cultura europeia, nem espaço, nem cabimento.
- Em Portugal temos algumas excepções felizes, em que se inserem os escritos de Sabastião da Gama, uma execelente leitura para todos os professores.
- A perspectiva da construção da identidade docente com uma base afectiva é relativamente recente: está associada à investigação emancipatória e aos modelos de análise pós-estruturalistas e ao estudo do papel das emoções e da comunicação com os outros na sobrevivência e na adaptação do ser humano.
- O exercício da docência liga-se fortemente à nossa vida pessoal, porque investimos o nosso “self” na profissão, investimos os nossos valores, as nossas crenças. O que fazemos na sala de aula influencia a nossa auto-estima, a nossa satisfação profissional, mas também a nossa vulnerabilidade.
- Esta perspectiva do docente social e político assenta no princípio de que as nossas emoções são socialmente construídas e é diferente da perspectiva psicologizante da emoção como fenómeno com locus interno.
- Actualmente, sobretudo com o conhecimento trazido pela neurociência, não podemos falar das dicotomias cartesianas entre a emoção e a razão, o corpo e o espírito porque, em última análise, elas representam uma ideologia de minorização do discurso feminino. Ora, temos mudar de modelo conceptual, de repensar na relação entre conhecimento e emoção como mutuamente constitutivos e interdependentes: a razão pressupõe emoção e vice-versa, uma vez que as nossas emoções estão sujeitas à interpretação racional.
- Nesta óptica, acalentar emoções ainda não racionalizadas é saudavelmente positivo, porque as emoções são potencialmente subversivas e, nessa perspectiva, instrumentos de liberdade.
- A nossa identidade profissional forma-se assim numadinâmica de um projecto individual e de socialização, em que as fronteiras entre a vida pessoal e profissional se esbatem.
- Os períodos de mudanças a nível político, económico, legislativo e social criam sentimentos de perda (Nias, 1996), de descrença e abandono (How people learn, Capítulo 8, 1999), de vivência de um paradoxo inerente à profissão que é o de ter de conciliar egocentrismo e abnegação.
- A identidade e o discurso dos docentes formam-se nos contextos específicos da organização do ensino, das expectativas, requisitos e discursos que moldam a construção da profissionalidade.
- O papel e a função não determinam a identidade; enquanto o papel é atribuído, a identidade é uma construção social. A perspectiva pós estruturalista da identidade docente é um caminho promissor na procura da novas formas de os professores fazerem valer a sua autoridade profisional.
Este post já vai longo. Num outro irei explicar como surgiu a escrita de diários no exercício da reflexividade docente.
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