terça-feira, maio 01, 2007

Condição docente e blogosfera

Porque é que muitos docentes por esse mundo fora utilizam a blogosfera para reflectirem sobre a sua condição? Algumas explicações:

  1. Não é tradição entre os professores falar-se de emoções em contexto profissional: tradicionalmente, um professor é um racionalista, um especialista (Britzman, 1986, 1991), um contexto semiótico em que o self, o sentimento de si, não tem, na tradicioção racionalista que giza a cultura europeia, nem espaço, nem cabimento.
  2. Em Portugal temos algumas excepções felizes, em que se inserem os escritos de Sabastião da Gama, uma execelente leitura para todos os professores.
  3. A perspectiva da construção da identidade docente com uma base afectiva é relativamente recente: está associada à investigação emancipatória e aos modelos de análise pós-estruturalistas e ao estudo do papel das emoções e da comunicação com os outros na sobrevivência e na adaptação do ser humano.
  4. O exercício da docência liga-se fortemente à nossa vida pessoal, porque investimos o nosso “self” na profissão, investimos os nossos valores, as nossas crenças. O que fazemos na sala de aula influencia a nossa auto-estima, a nossa satisfação profissional, mas também a nossa vulnerabilidade.
  5. Esta perspectiva do docente social e político assenta no princípio de que as nossas emoções são socialmente construídas e é diferente da perspectiva psicologizante da emoção como fenómeno com locus interno.
  6. Actualmente, sobretudo com o conhecimento trazido pela neurociência, não podemos falar das dicotomias cartesianas entre a emoção e a razão, o corpo e o espírito porque, em última análise, elas representam uma ideologia de minorização do discurso feminino. Ora, temos mudar de modelo conceptual, de repensar na relação entre conhecimento e emoção como mutuamente constitutivos e interdependentes: a razão pressupõe emoção e vice-versa, uma vez que as nossas emoções estão sujeitas à interpretação racional.
  7. Nesta óptica, acalentar emoções ainda não racionalizadas é saudavelmente positivo, porque as emoções são potencialmente subversivas e, nessa perspectiva, instrumentos de liberdade.
  8. A nossa identidade profissional forma-se assim numadinâmica de um projecto individual e de socialização, em que as fronteiras entre a vida pessoal e profissional se esbatem.
  9. Os períodos de mudanças a nível político, económico, legislativo e social criam sentimentos de perda (Nias, 1996), de descrença e abandono (How people learn, Capítulo 8, 1999), de vivência de um paradoxo inerente à profissão que é o de ter de conciliar egocentrismo e abnegação.
  10. A identidade e o discurso dos docentes formam-se nos contextos específicos da organização do ensino, das expectativas, requisitos e discursos que moldam a construção da profissionalidade.
  11. O papel e a função não determinam a identidade; enquanto o papel é atribuído, a identidade é uma construção social. A perspectiva pós estruturalista da identidade docente é um caminho promissor na procura da novas formas de os professores fazerem valer a sua autoridade profisional.

Este post já vai longo. Num outro irei explicar como surgiu a escrita de diários no exercício da reflexividade docente.

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