quarta-feira, abril 30, 2008

Já sabíamos que

O impacto económico das reprovações no nosso país é brutal

Não tenho uma panorâmica exaustiva da situação geral no país. Estou em crer, contudo que, com uma boa gestão, é possível responder adequadamente em tempo útil a situações de dificuldades escolares, uma vez que existem recursos humanos disponíveis e razoavelmente suficientes com uma gestão adequada, para o país que somos.
Porque temos afinal tantas reprovações?
Em primeiro lugar, porque somos ainda um país com um nível de escolaridade muito baixo, problema que vai demorar, como demorou noutros países, várias gerações a ultrapassar. O problema é que, no nosso, habituámo-nos a pensar que tudo se conquista com facilidade e um pouco à margem da lei. Foi a democracia do sucesso, do crime económico, do compadrio, do dinheiro fácil, da falsificação, da fuga ao fisco, da contrafacção, do glamour, da ostentação, dos paraísos fiscais, dos self-made men, da ridicularização do esforço, do trabalho, do estudo sérios, honestos, esforçados.

Poderíamos e deveríamos fazer um esforço para dirimir os nossos vários atrasos, designadamente na educação, desde que implicássemos e responsabilizássemos todos os actores, isto é, que os professores ensinassem, os alunos estudassem e os pais se responsabilizassem pelo empenhamento académico dos filhos.
Toda a gente compreende e aceita que não podemos ter tantas reprovações, do mesmo modo que toda a gente compreende e aceita que não podemos ter tantos mortos na estrada, mas no dia seguinte tudo fica na mesma. Ter tantas reprovações é, aliás uma evidência do nosso atraso económico, social e cultural.
Contudo, numa reprovação, há três sujeitos com responsabilidades partilhadas, tendo cada um que assumir as suas e as leis em vigor que enquadrar essa assunção; é nesse ponto que o novo estatuto do aluno volta a falhar.
Já no ano passado chamei aqui à atenção para o novo estatuto do aluno e para a dificuldade em operacionalizar a responsabilização dos pais que o estatuto invoca. Como fazê-lo?
Por exemplo, uma das dificuldades com que nos deparamos é termos aulas de recuperação calendarizadas e os alunos não comparecerem. Os professores estão lá à espera e os meninos não aparecem.
De que instrumentos de actuação dispomos?Avisamos os pais e no dia seguinte os alunos tornam a faltar. Marcamos falta? Quais são os efeitos dessa falta?E que efeitos tem uma falta de trabalho de casa? Porque ou como é que um aluno de 10, 15 ou 17 anos tem autonomia para decidir que não faz o que o professor manda fazer? O trabalho de casa é essencial, sobretudo para os alunos com menos capacidade intelectual e com menos recursos familiares ou de estratos sociais mais desfavorecidos.
É todo um conjunto de valores e de princípios que deixámos ir pelo cano e que agora temos de ir buscar de volta, sob pena de estarmos a deitar uma geração às urtigas.
A responsabilidade é nossa. Sobretudo, de quem define as políticas e faz as leis.

segunda-feira, abril 28, 2008

Jovens que excedem as expectativas do estudo da Universidade Católica


Coloquei à minha filha mais nova, que acabou de completar 18 anos, as três perguntas do questionário que o Sr. Presidente da República encomendou à Universidade Católica.
À pergunta: "O Partido Socialista tem a maioria absoluta?", respondeu-me:
- Espero bem que não!

sábado, abril 26, 2008

A Escola a tempo inteiro é uma invenção de estalinistas serôdios, a quem só falta "implementarem" a tal injecçãozinha letal atrás da orelha dos velhinhos para criarem a sociedade perfeita, organizada e limpa, visionada por Estaline.
Crianças e velhos são impecilhos maçadores da flexiblidade do capitalismo pós-moderno que desrentabilizam a produtividade máxima do trabalhador robotizado, maleável, exportável, deslocalizável, descartável, reciboverdável e sempre disponível para (a)ceder à vontade do empregador: é preciso partir às 8 da noite para qualquer ponto do país ou do estrangeiro? Aqui vai ele, livre, solícito e prestável. A família pode esperar.

A família deixa assim de ser a primeira e principal instituição de socialização da criança, para se tornar num apêndice secundário a que se recorre quando a escola fecha.

De onde é que vem esta ideia peregrina? Só pode ser do estalinismo. Ajudem-me os historiadores. Há, na história da Humanidade uma herança mais forte que a estalinista, contando que agora estamos a considerar a educação de ambos os géneros?

A família é o esteio da educação dos afectos por excelência. O essencial para a vida, aquilo que é a nossa natureza, a nossa essência, os nossos instrumentos é na família que se adquire. A escola é um mero adjuvante da socialização do indivíduo.
Será que esta gente ensadeceu e quer transformar todas as nossas crianças em crianças institucionalizadas?

Quais são as consequências desta institucionalização ao nível da auto-estima e da auto-determinação dos mais novos?

Não se nasce selvagem. Quando se nasce, nasce-se filho de alguém, não da escola.


Motivação Autónoma dos professores


Durante este ano lectivo, as diversas estruturas de gestão escolar mal têm tido tempo para se debruçar sobre as questões do ensino, da aprendizagem e da avaliação dos alunos.

As agendas das estruturas de gestão superior e intermédia, como os Conselhos Pedagógicos e de Departamento têm estado atulhadas com as questões da avaliação de desempenho dos professores, das quais resultou afinal, um modelo de avaliação mínimo a aplicar somente aos professores contratados.
Como diria Shakespeare: Much Ado about nothing.

No fim das contas, a questão está em saber se esta governação que parecia movida por uma fúria obsessiva de legislar e de mostrar obra feita no matter what and who, aprendeu alguma coisa com os tão almejados resultados.

Na verdade, e tanto quanto me é possível, objectivamente, avaliar, os resultados foram mais que péssimos.

Foram péssimos, porque em nada se avançou em matéria de avaliação de desempenho e em termos de confiança entre os profissionais e a tutela houve estragos que dificilmente serão reparáveis.

Foram péssimos, porque o trabalho com os actores principais deste filme foi remetido para um plano mais que secundário.

Foram péssimos porque os estragos na motivação autónoma dos professores foram enormes e dificilmente recuperáveis.

A motivação autónoma dos professores, tal como a definiram e descreveram Friedman & Farber, 1992; Maslach & Jackson, 1981e Roth, Assor, Kanat, Maymon, & Kaplan, 2007 associa-se positivamente a sentimentos de realização pessoal e negativamente a sensações de exaustão.

Ora, de há vários anos para cá, os professores sentem-se cada vez mais exauridos e cada vez menos realizados; logo, é natural e expectável que a sua motivação autónoma esteja francamente em baixa.

Normalmente, quando os professores se sentem autonomamente motivados (ou auto-determinados), essa autodeterminação é acompanhada por uma sensação de vitalidade; pelo contrário, se os esforços que têm de fazer são para responder às exigências de um sistema que os hostiliza, os professores sentem-se exaustos e esgotados (La Guardia, Ryan, Couchman, & Deci, 2000; Niemiec et al., 2006; Ryan & Frederick, 1997), porque percepcionam os seus esforços como inúteis e sem sentido.

Quando os esforços fazem sentido e são úteis, são mais fáceis de tolerar, as experiências negativas e os obstáculos tornam-se menos cansativos e menos frustrantes
.

sexta-feira, abril 25, 2008


Quem sai aos seus não degenera.
De que se admira o Sr. Presidente?


Pior do que os adolescentes não saberem se o PS governa ou não com maioria absoluta é o PS ter aprovado para o 2º. ciclo áreas curriculares disparatadas como a Área de Projecto e o Estudo Acompanhado.

Mas, pronto, à primeira qualquer cai.

Pior que isso ainda, é perseverar no disparate durante anos a fio, sem qualquer avaliação da introdução das respectivas áreas curriculares e perante os resultados que os alunos, ano após ano, vão apresentando a nível internacional em disciplinas nucleares como a Língua Portuguesa, a Matemática e as Ciências Naturais.

Quem sai aos seus não degenera, certo?


Combater a ignorância e a resignação


O Sr. Presidente da República, à semelhança do ano passado, pediu ao jovens que não se resignem. Admitiu ainda, com base num estudo por si encomendado, que a ignorância política dos jovens portugueses é muito superior à desejável.

A ignorância é sempre acima da conta mas, no caso em apreço, nem é muito surpreendente: porque é que os jovens haviam de saber quem foi o primeiro Presidente da República após o 25 de Abril, se eventualmente não saberão quem é o actual?

Porque é que os jovens hão-de saber quantos países constituem a União Europeia, se nem sequer dominam conhecimentos básicos na Língua Portuguesa, nas Ciências e na Matemática?

Um problema é que ignorância e resignação andam de mãos dadas. Não se resignar é sinal de vitalidade, de resiliência, de auto-estima, de capacidade para enfrentar a adversidade e de lutar para mudar a vida; para tal, são necessárias ferramentas - psicológicas e materiais - designadamente uma educação, uma instrução, um sistema de valores sólidos e bem estruturados. Outro problema é que um sinal de não resignação, de resiliência,de vitalidade juvenil será eventualmente, nos dias que correm, fazer as malas e ir à procura de trabalho além-fronteiras, como no tempo de Camilo Castelo Branco ou como há umas décadas atrás.

O Sr. Presidente da República poderia mandar perguntar em quantas Escolas portuguesas houve, no presente ano lectivo, um simples sinal de comemoração do 25 de Abril, quanto mais não seja, nos espaços de maior passagem: um cartaz, um poema, uma frase, uma ideia que fosse. Vou-lhe escrever a pedir-lhe que o faça.

O Sr. Presidente da República poderia mandar perguntar a percentagem de tempo dedicada às questões do ensino e da aprendizagem que foi utilizada nas diversas instâncias da gestão escolar durante o presente ano lectivo. Não lhe vou pedir que o faça, porque há quem o deva fazer e daí tirar algumas conclusões.

O Sr. Presidente da República verificaria, se o fizesse, que tem um país virado ao contrário, pelo menos no que respeita a educação.

Este não é, de facto, o futuro que sonhámos; mesmo para quem não sonha muito, às vezes, parece até um autêntico pesadelo.

Liberdade


Ninguém é mais escravo do que aquele que se considera livre sem o ser.

(Goethe)

quinta-feira, abril 24, 2008

Apocalypse Now, um cartoon de David Parkins, exposto na Worldpress Cartoon 2008.
Embora haja trabalhos muito bons, este foi um dos que mais me impressionaram.

terça-feira, abril 22, 2008

A chave para uma comunicação e aprendizagem eficazes somos nós

A interacção eficaz com os alunos depende de uma comunicação eficaz. Um bom professor mantém os alunos envolvidos nas actividades da aula e recorre a estratégias que realçam a probabilidade de os resultados de aprendizagem desejados serem alcançados. Os exemplos de tais estratégias incluem despoletar e manter o interesse dos estudantes focalizando-o no material que está a ser apresentado, utilizando exemplos que os estudantes compreendem. Outras estratégias eficazes incluem apresentar o material de diversas formas, de modo a contemplar os diversos estilos cognitivos. É também muito mais fácil para os estudantes apreciar o valor e a importância de aprender, se estiverem interagindo com um professor que lhes apresente os materiais pedagógicos de forma consistentemente interessante e desafiante e com quem possam manter uma relação baseada na confiança.

domingo, abril 20, 2008

Modelos de avaliação do sistema educativo


O caso dinamarquês


No ano lectivo de 2006/2007 foi introduzida a obrigatoriedade de exames nacionais nos nove anos da escolaridade obrigatória, com o objectivo principal de melhorar a cultura de avaliação. Serão feitos 10 exames nacionais a Língua materna, a Matemática, a Ciências e a Inglês.

Existe ainda uma entidade independente, o Instituto Dinamarquês de Avaliação, que conduz avaliações do sistema a todos os níveis, tanto do ensino privado, como do público. Não é, contudo, permitido qualquer sistema de ranking.



Leituras do dia


Há muitas moradas na casa do meu pai.

(Jo, 14:2)

Retalhos do dia

À Sexta-feira, ao fim da tarde, quando o corpo anseia pelo descanso merecido, a vontade da comunidade pede mais: mais poesia, mais convívio, mais sorrisos, mais partilha.(imagem retirada de Esboço a vários traços)

quinta-feira, abril 17, 2008

Rir poema

Amanhã é dia de sessão pública de poesia da nossa escola e tudo tem de estar afinadinho. A poesia inglesa vai estar presente junto a mim que, contudo, irei dizer um Cesário Verde bem rústico e "anti-burguês". O meu aspie de estimação também vai dizer poema.

Sentámo-nos com dois livros de poesia juvenil inglesa e começámos a folheá-los à procura de algo interessante, desde rimas a trava-línguas havia um pouco de tudo. Líamos à vez, algumas eram bem divertidas e faziam-no rir abertamente.

A tarde, contudo, não havia começado bem. Quando cheguei ao bloco e o vi sentado à minha espera, percebi que havia caso. Como tem uma pele muito branca e fina, quando é acometido irritação, fica com a cara muito vermelha e inchada.

O que se passa?

Entrara de novo em conflito com dois colegas da turma. Combinámos então que eu faria entrar os outros e que o chamaria assim que todos tivessem entrado.

Assim foi. Por debaixo da porta da sala contígua, tinha o corpo escondido com os pés de fora. Lá veio, depois de chamado.

Entrou na sala, mas não abriu o dossiê:

Está estragado. O P e o N. estragaram-mo.

Bom, fazes os trabalhos, que eu vou arranjar-te um dossiê novo.

Como é que eu posso fazer os trabalhos, se não posso abrir o dossiê?

Tens aqui uma folha

Casmurrou


Queres casmurrar? Então, está bem. Eu sento o meu rabo na cadeira e também não te arranjo um dossiê, pronto.

Aflorou-se-lhe um quase-sorriso por causa da quebra do interdito do "rabo" na aula.

Lentamente, como uma crisálida, descasulou, esticou os braços e começou a trabalhar.


Uhmmmm... primeiro, acabas esse exercício e depois é que vou arranjar-te um dossiê... és do Benfica ou do Sporting?

Sporting

Bom, já volto, então... mas só há dossiê se tudo estiver registado, entendemo-nos?

Acabámos a tarde a rir poema. Vamos lá ver como nos sai o amanhã.


Soleil serpent œil fascinant mon œilet
la mer pouilleuse d'îles craquant aux doigts des roses
lance-flamme et mon corps intact de foudroyé
l'eau exhausse les carcasses de lumière perdues dans le couloir sans pompe
des tourbillons de glaçons auréolent le cœur fumant des corbeaux
nos cœurs
c'est la voix des foudres apprivoisées tournant sur leurs gonds de lézarde
transmission d'anolis au paysage de verres cassés
c'est les fleurs vampires à la relève des orchidées
élixir du feu central
feu juste feu manguier de nuit couvert d'abeilles
mon désir un hasard de tigres surpris aux soufres
mais l'éveil stanneux se dore des gisements enfantins
et mon corps de galet mangeant poisson mangeant
colombes et sommeils
le sucre du mot Brésil au fond du marécage.


Aimé CESAIRE(1946)
Aimé Cesaire faleceu hoje.

segunda-feira, abril 14, 2008

O Sr. Secretário de Estado diz que acabou a situação de conflito entre o Ministério da Educação e os professores. Será?

A maioria de nós gostaria que assim fosse. É verdade que a tensão diminuiu, duvido é que a situação conflitual não venha a subir de tom dentro de alguns meses.

Algo de muito interessante e novo - pelo menos entre os professores portugueses - está em cima da mesa: a indignação dos professores extravasou o âmbito sindical. No processo, geraram-se dinâmicas próprias que ressurgirão se as pessoas não ficarem satisfeitas com as estratégias sindicais: os sinais disso são evidentes.

A conjuntura é favorável à continuação do processo reivindicativo. Eventualmente, esse processo acabará por se centrar numa luta por uma avaliação de desempenho menos burocrática e menos consumidora de energias.

A dinâmica dirá até onde há coesão, mas não creio que o conflito tenha acabado: está apenas em banho-maria.

domingo, abril 13, 2008


Tem algum cabimento?

De repente, o ou a coordenador(a) ter de ir assistir a aulas dos colegas, com trinta e mais anos de serviço, quando toda a gente já sabe de toda a gente, defeitos, virtudes, tiques e quando já nos conhecemos todos, porque temos parcerias em que semanalmente, até mais de uma por semana, vamos às aulas uns dos outros?

Justifica-se, enfim, quando há indícios de falta de competência na gestão da sala de aula, ou até em casos em que um jovem professor está, pela primeira vez numa escola mas, na maioria das situações, o esforço é totalmente gratuito.

Vê-se mesmo que isto da assistência às aulas são ideias de quem não faz a mínima ideia de como se trabalha no ensino não superior.

Como se vê, ainda há muita coisa para discutir e clarificar.

As minhas canções




You raise me up, so I can stand on mountains;
You raise me up, to walk on stormy seas;
I am strong,when I am on your shoulders;
You raise me up... To more than I can be.

Poesia no feminino

A tua pele como a alvorada
A minha pele como o almíscar

Uma, pinta o começo
De um certo fim.

A outra, o fim de
De um começo seguro.


Maya Angelou.
Quadro de Dawn Meson: Colisão II

De que é feito, afinal, o nosso dia-a-dia?

Quando ouvimos os fazedores de opinião a falarem sobre a educação e a escola, a nossa tendência, ao ouvirmos tanto disparate, é exclamarmos:

- Não faz a mínima ideia do que é o dia-a-dia nas nossas escolas!

Então, porque é que não contamos o que é o dia-a-dia nas nossas escolas?

Seria, de todas as formas, bom que o fizéssemos: para nós próprios, como exercício de reflexão, para partilharmos com os pares, para uma reflexão distribuída, e para fazermos perceber aos que estão de fora os nossos dilemas.

Frequentemente falo das minhas coisas à minha família e aos meus amigos e esse exercício costuma ser bom para mim, porque, de repente, o raciocínio está de tal modo viciado, que o que é evidente, deixa de ser. Preciso então de alguém com uma visão mais objectiva me diga: "sim, o que fizeste está certo" ou, pelo contrário, me diga: ”mas o que fizeste vai dar a mensagem contrária ao que pretendes”. Isto, mesmo sendo a pessoa razoavelmente segura, convicta e experiente que sou.

Continuo sem perceber porque há professores que continuam a considerar a sala de aula o espaço do indizível, um espaço privado, de que não se fala, reservado ao professor e aos seus alunos, que continuam a falar em “formas criativas de envolver os alunos e de melhorar a sua aprendizagem com estratégias baseadas em investigação sólida, blá-blá-blá…”

Como é que fazemos?
Como decidimos?
Com que problemas e dificuldades nos deparamos?

Para quem está de fora, as soluções são mais ou menos algorítmicas; para nós, são complexas e situadas.

Penso que uma das pessoas que melhor fazem essa descrição é a 3za.
Eu posso, objectivamente, ir ao Scratch e, guiando-me pelas descrições dela, experimentar eu própria.

Diz-me os teus resultados, dir-te-ei quanto vales...


Em teoria é razoável pensar-se que a forma mais simples de avaliar um professor é através dos resultados dos seus alunos, já que, em última instância, ensinar é ajudar os alunos a aprender.

Contudo, para avaliar os resultados dos alunos em larga escala, seria necessário que fossem construídos testes estandardizados, o que torna o procedimento, por um lado, oneroso, e por outro, injusto porque não tem em conta as tremendas diferenças individuais, locais e regionais.

Mais ainda, os testes estandardizados tendem a avaliar competências de nível inferior, tais como o conhecimento e a compreensão e em apenas algumas disciplinas. As competências superiores como o pensamento crítico, criativo e analítico ficariam largamente excluídas do processo de avaliação. Ora, é justamente no desenvolvimento destas competências superiores que os melhores professores, os mais empenhados, apostam.

Quem é professor, sabe que qualquer professor pouco qualificado e empenhado tem bons resultados com meninos privilegiados; pelo contrário, para quem trabalha com meninos carenciados, menos capazes e preparados, todos os progressos, por pequenos que sejam, consomem muito tempo e esforço, conquistam-se passo a passo, e não se medem por testes estandardizados. Não é, portanto, justo um sistema de avaliação baseado nos resultados dos alunos.

Um tal sistema de avaliação, num país pequeno como o nosso e ainda muito dominado por sistemas de influência baseados no poder social, é um incentivo à reprodução na sala de aula das desigualdades sociais - que parecem ser cada vez maiores - uma injustiça para os alunos mais mais frágeis, quer social, quer individualmente.

Mesmo que procurássemos medir as "mais-valias", como alguma investigação sugere, como seria possível calcular, nos professores de turma única ou mesmo naqueles que têm poucos alunos, porque têm turmas pequenas, com algum rigor estatístico, os impactos do ensino na aprendizagem dos estudantes?

São meras teorias, sem qualquer viabilidade prática, que, a serem aplicadas, só prejudicariam os alunos mais desfavorecidos, já que os professores tenderiam a rejeitá-los.

Mas se a Escola puder ser o contraponto para uma sociedade em que ainda há tantos meninos pobres, maltratados, incompreendidos, mal amados, melhor.

É com estes que eu gosto de fazer a diferença.

Pedro Bandeira Freire, o fundador do Cinema Quarteto, está internado em Santa Maria. Desejo sinceramente as suas melhoras. Este cinema foi importante na educação cinéfila da minha juventude.


Até que enfim, alguma tranquilidade...
Não se pode dizer que possamos, de todo, descansar e que o que se avizinha seja fácil. Contudo, o facto de se ter chegado a um entendimento em matéria de quem e como vai ser avaliado é já um bom começo de conversa. É verdade que as Escolas estavam em estádios diferentes em matéria de avaliação de desempenho; mas é igualmente verdade que, na maioria das situações, o "avanço" de algumas Escolas se fez à míngua de diálogo e de participação, gerando um sem número de conflitos de toda a ordem. Nesta situação, não se trata de nivelar por baixo, mas de clarificar regras e procedimentos, de modo a diminuir os focos de conflito e a introduzir alguma paz social que não se vivia há anos.
Não se trata, portanto, de clamar por vitórias e por derrotas, mas, tão só, de suspirar de algum alívio momentâneo. Para as posições mais extremas tratar-se-á de contar mortos e feriods; para a grande maioria, trata-se agora de nos reorganizarmos para conseguirmos um modelo de avaliação de desempenho mais justo, menos burocrático, menos consumidor de energias.
Alguns continuam a falar de injustiças, porque há titulares a serem avaliados por não titulares. Mas também há professores com competências informáticas a serem avaliados por outros mais ignorantes na matéria; assim como há professores bastante competentes em diferenciação da aprendizagem a serem avaliados por outros que o não serão tanto; ou professores mais qualificados em matéria de currículo e/ou de avaliação a serem avaliados por outros que o serão menos.
A vida é mesmo assim: não há regimes perfeitos. Há equilíbrios possíveis.

segunda-feira, abril 07, 2008

"A violência nas escolas não se resolve na Justiça".
Noronha de Nascimento


Nós sabemos que a violência nas escolas não se resolve na Justiça. O problema é que, não tendo a Justiça resolvido alguns casos que deveria ter resolvido, contribuiu para o seu agravamento. Assim, por falta de comparência sua, o princípio que estaria certo vai ter que ser sujeito a mais excepções que as necessárias, se a justiça tivesse intervindo na altura e na dose certas.
Vamos todos ter que emendar um pouco a mão, porque ninguem está isento de responsabilidades.

sábado, abril 05, 2008

O olho verde esmeralda

O olho verde esmeralda chegou à nossa escola por conta do "programa cromos pr'a troca" e só tem 10 anos.

O nosso primeiro encontro não correu lá muito bem: foi à tarde, quando ele já tem acumuladas todas as obstinações resultantes da sua dificuldade de interacção social.

Pedi ao olho verde esmeralda que me mostrasse o caderno para começarmos a trabalhar.

Disse que não tinha.

Então, abre a mochila para arranjarmos um sítio onde possas escrever.

Que não abria.

Para começar a trabalhar com o livro, desviei-lhe o boné (vermelho), que teimava em ter em cima da mesa.

Arrancou-mo com força da mão que mal tocara no dito.

Resolvi que tinha que de impor alguns pré-requisitos e exigi que me pedisse desculpas.

Pediu-me desculpas, sem sequer me olhar, como um funcionário enfadado.

Não aceitei.

Agarrou-se ao rato do computador que estava por perto e tentou surfar na net.

Não deixei.

O olho verde esmeralda gosta de trabalhar com computadores e eu também. Mas só vai utilizar o computador depois de 3 (três) aulas seguidas com caderno.

O olho verde esmeralda começou então a olhar-me com atenção e a medir-me e cada um dos meus gestos. Para alguém que faz questão em ignorar os interesses do outro, até pode não ser um mau começo.

Isto promete...

As "minhas" clássicas: Concerto para harpa e flauta de Mozart



Investigação por questionário, post 4


Perguntas e escalas

A escala mais utilizada em questionários é a de resposta do tipo Likert. Esta escala permite que o inquirido considere uma opinião e, sobre ela, tome uma posição que pode ir da aprovação forte à desaprovação forte.
O procedimento mais comum de formulação de perguntas do tipo Likert consiste em (adaptado de Selltiz, et al., 1963):
1. reunir um grande número de indicações relevantes para a atitude que está a ser investigada;
2. aplicar um teste piloto;
3. se o questionário incidir sobre várias atitudes, misturar as perguntas para conseguir respostas mais válidas;
4. a selecção aleatória de algumas perguntas e o flip-flap da escala concorda fortemente - discorda fortemente pode impedir que o inquirido adopte um padrão de resposta (que habitualmente é denominada por resposta ajustada). Neste caso, há que inverter o valor da resposta, isto é se o respondente atribuiu um 1, num questionário com uma escala de 1 a 4, teremos que atribuir 4 à resposta; se atribuiu 2, temos que atribuir 3; se atribuiu 3, temos que atribuir 2 e se atribuiu 4, temos de atribuir um 1.

A pesquisa psicométrica tem vindo a demonstrar que os questionários de escalas devem ter até sete níveis de resposta. Quatro a cinco pontos da escala é geralmente suficiente para permitir uma indicação de confiança.
Pessoalmente, prefiro as escalas com um nível par de respostas, para impedir a tendência da resposta central; o número par também de dá a indicação da tendência positiva ou negativa dos respondentes. Esta é, contudo, uma matéria muito controversa.
Prefiro também questionários inteiramente constituídos por respostas fechadas, mas reconheço que, em áreas de investigação ainda pouco exploradas, como a minha, são necessárias perguntas abertas que nos podem colocar perante problemas de investigação ainda pouco explorados.

Os meus poemas favoritos


Não tens corpo, nem pátria, nem família,
Nem te curvas ao jugo dos tiranos.
Não tens preço na terra dos humanos,
Nem o tempo te rói.
És a essência dos anos,
O que vem e o que foi...

És a carne dos deuses,
O sorriso das pedras,
E a candura do instinto.
És aquele alimento
De quem, farto de pão, anda faminto...

És a graça da vida em toda a parte,
Ou em arte,
Ou em simples verdade.
És o cravo vermelho,
Ou a moça no espelho,
Que depois de te ver se persuade...


És um verso perfeito
Que traz consigo a força do que diz.
És o jeito
Que tem, antes de mestre, o aprendiz...


És a beleza, enfim! És o teu nome!
Um milagre, uma luz, uma harmonia,
Uma linha sem traço…
Mas sem corpo, sem pátria e sem família,
Tudo repousa em paz no teu regaço!



Miguel Torga

(quadro de Yarnbykh: Mulher com arco )

Conclusões da Reunião Plenária do CCAP de 14 de Março



  • Abanar o pescoço e fazer tocar o badalo da subserviência carreirista:

Aprovou as “Recomendações sobre a elaboração e aprovação pelos Conselhos
Pedagógicos de instrumentos de registo normalizados, previstos no DR 2/2008”,
formuladas pela Presidente em 25 de Janeiro de 2008.

  • Melhor que isto, só Pilatos, ele próprio:

O Conselho considerou, ainda, que a credibilidade e a eficácia de um modelo de
avaliação de desempenho – que tem como finalidades principais o desenvolvimento profissional dos docentes e a melhoria das aprendizagens dos alunos – requerem
tempo e reflexão, de modo a permitir a desejável apropriação e participação por parte de avaliadores e avaliados.

Mais um motivo de instabilidade:


ACÓRDÃO Nº 184/2008 do Tribunal Constitucional,12 de Março de 2008


Uma decisão que põe em causa a legalidade do concurso para professor titular


Assim sendo, ao introduzir tal diferença [excluir do universo de docentes que podem ser opositores ao concurso para acesso para professores titulares aqueles que se encontrem em situação de dispensa total ou parcial da componente lectiva – o que, como já vimos, abrange as situações existentes até 2007] no regime do irrepetível concurso de recrutamento transitório o legislador lesa o direito consagrado no nº 2 do artigo 47º. O bem jusfundamental que aqui se protege – e que é precisamente o da igualdade na promoção da carreira – é negativamente afectado pela exclusão [nas candidaturas ao concurso] operada pelo nº 5, alínea c) do artigo 15º do Decreto-Lei nº 15/2007, sendo tal afectação negativa desproporcionada, porque excessiva face a quaisquer outros bens ou interesses que, através dela, se quisessem prosseguir.


Assim, o Tribunal Constitucional decidiu:


c) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma contida no artigo, 15.º n.º 5, alínea c) do referido Decreto-Lei n.º 15/2007, por violação do nº 2 do artigo 47.º da Constituição.



Quanto às outras decisões decorrentes do pedido de inconstitucionalidade apresentado por um grupo de vinte e cinco Deputados à Assembleia da República, pode consultá-las no referido acórdão e apreciar para cada um dos pedidos, as declarações de voto do dos diversos juízes intervenientes, que demonstram a controvérsia que os assuntos em apreço suscitam.


Estarão a querer dar connosco em doidos?...

Ou terão que fazer um concurso especial para os professores que, afectados pela cláusula de exclusão, não puderam concorrer ao primeiro?

quinta-feira, abril 03, 2008

Sobre a avaliação de desempenho

No meu Agrupamento há cerca de 20 professores contratados. No meu departamento, há 1 professora contratada. Na última reunião de departamento, vários professores, titulares e não titulares ofereceram-se para ajudar a nossa jovem colega contratada a estabelecer os seus objectivos e naquilo que for preciso, dentro do que for decidido pelo Conselho Pedagógico. Porque, se divisões artificiais nos separam, há algo que nos pode unir: a solidariedade e o profissionalismo. É nosso dever contribuir para que nenhum professor se sinta só com a sua avaliação, sobretudo quando tem de a fazer pela primeira vez nos moldes em que terá de a fazer. Independentemente da forma como encaramos este modelo de avaliação aberrante, burocrático e arbitrário, que é uma luta à parte, os professores contratados têm de saber que contam com a nossa experiência e o nosso saber profissional.

É o que eu penso.

Órgãos directivos de escolas "têm dever cívico" de comunicar casos de violência, adverte o Sr. Procurador-Geral da República

Muitos não o fazem; ou porque consideram que não vale a pena - houve casos entregues à Polícia e ao Ministério Público que fizeram descrer da eficácia da medida, isto é passámos demasiados anos com a percepção da maior impunidade; ou porque - a ponta do icebergue ainda não se vê - escondem a todo o custo o que se passa no interior da Escola, por puro carreirismo.

Não sei se é comum o conhecimento da fragilidade em que os colegas que foram agredidos, roubados ou ameaçados ficam. Deveria ser-lhes dado todo o apoio por parte das direcções escolares. Nos casos que acompanhei pessoalmente aconteceu exactamente o inverso. É uma atitude pusilânime.






Para guiar a minha reflexão na acção para o dia de hoje, escolhi estas palavras recentes de Alice Vieira, visita assídua da nossa "casa".


Há anos que as nossas crianças não são educadas por pessoas.

Há anos que as nossas crianças são educadas por ecrãs.

E o vidro não cria empatia. A empatia só se cria se,

diante dos nosso solhos, tivermos outros olhos,

se tivermos um rosto humano.

Assim, não é possível


A educação está a atravessar uma tal deriva, que só com muita dificuldade será possível manter o clima de serenidade necessário a um ambiente de trabalho propício ao ensino e à aprendizagem até ao final do ano lectivo.

Quando, às pessoas que querem, honestamente, dialogar, clarificar, fazer bem, a resposta é mandar calar e obedecer, quando o ruído comunicacional aumenta de forma tão ensurdecedora, que desemboca sempre numa situação em que ninguém está mais disposto ou consegue ouvir alguém, desencadeia-se um vozear paroxístico a partir do qual, a menos que a alguém que possa faça alguma coisa, não pode resultar nada de bom.

quarta-feira, abril 02, 2008

Os meus poemas favoritos


Pusemos tanto azul nessa distância

ancorada em incerta claridade
e ficamos nas paredes do vento
a escorrer para tudo o que ele invade.

Pusemos tantas flores nas horas breves
que secam folhas nas árvores dos dedos.
E ficámos cingidos nas estátuas
a morder-nos na carne dum segredo.

Natália Correia

terça-feira, abril 01, 2008

Os meus poemas favoritos

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...

Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...

Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...


Florbela Espanca (com pintura de Chagall)