quarta-feira, abril 25, 2007

As “comissões de segurança” são a última novidade da Comissão de Educação, Ciência e Cultura da Assembleia da República. De acordo com o respectivo grupo de trabalho, tais comissões virão a ser constituídas por representantes de alunos, professores, pais, pessoal auxiliar e forças de segurança.Os pormenores do relatório não são totalmente públicos, de modo a podermos avaliar com maior rigor os fundamentos da proposta; teoricamente, sou favorável a uma maior autonomia e considero que é uma boa ideia integrar a prevenção de comportamentos de risco nos projectos educativos dos estabelecimentos de ensino e, em princípio, é de supor que a questão já esteja a ser levada em consideração, em função das percepções que as diversas comunidades educativas têm da sua situação específica, em matéria de segurança.Não é de estranhar que seja sugerido o recurso a meios electrónicos para melhorar as condições de segurança, porque a medida é liminarmente óbvia, já está em curso e só tem de ser melhorada, à medida que os recursos o forem permitindo.As referências à articulação das diferentes estruturas a nível regional e municipal é uma elaboração elementar e um desenvolvimento natural do funcionamento dos sistemas complexos e em rede, sem os quais a sociedade actual não se desenvolve, nem sobrevive.Que as agressões a profissionais de educação passem a ser crime público, parece-me um desenvolvimento óbvio e esperável do que já está previsto no actual código penal, tendo em conta a complexificação dos problemas de segurança da sociedade. É igualmente patente que se torna necessário melhorar as condições físicas das instalações degradadas que ainda proliferam no nosso parque escolar.Quanto aos cuidados que há a ter com os perigos da Internet e de como devem ser enfrentados no espaço escolar, já a eles me referi com algum pormenor, mas também não considero que sejam questões críticas, nem podemos posicionar-nos relativamente a elas numa perspectiva de proibição liminar, como fazem os sectores de opinião mais conservadores, designadamente dos Estados Unidos. Temos de encontrar soluções que equilibrem os riscos reais com os benefícios evidentes, em termos de literacia informática e de acesso à informação.Esta iniciativa da Assembleia da República visa afinal articular todas estas ideias e de as sistematizar em propostas legislativas coerentes, uma vez que toda a legislação em matéria de educação tem de ser revista com rigor, dado o estado caótico em que nos encontramos, o que, paulatinamente, como tem vindo a ser feito e “arrumado”, com as naturais resistências, desconfianças ou expectativas, quiçá desmesuradas, de uns e outros.Que tudo isto pode contribuir para uma Escola mais segura e que se pode consubstanciar num grupo de trabalho específico dentro dos órgãos de decisão já existentes na Escola, sem serem necessárias alterações estruturais de monta, é um facto indesmentível.Que isto possa contribuir para o sucesso escolar, já é algo que a investigação não justifica claramente, porque as variáveis mais críticas de sucesso escolar não se prendem exactamente com esta questão da segurança.A conclusão mais relevante desta comissão parece prender-se com a caracterização mais rigorosa e exaustiva das diversas perturbações da normalidade, designadamente na distinção e tipificação mais claras do que é indisciplina e do que é violência e das variáveis que determinam um e outro fenómeno, porque essa clarificação permite formas de intervenção mais cirúrgicas, com objectivos e prioridades claramente definidos, estratégias mais adequadas e uma melhor aplicação de recursos.Assim sendo, não entendo, nem as reacções de rejeição epidérmica a estas iniciativas legislativas que visam sistematizar o combate à degradação do clima na Escola, nem as outras que parecem vislumbrar nela A iniciativa do século em matéria de educação.Trata-se tão-somente de uma reacção normal e adequada, que só pode pecar por tardia ou frouxa, nos seus contornos práticos, ao que já se está a viver em termos de segurança e àquilo que é possível prever em termos de desenvolvimentos futuros.Do meu ponto de vista, o que é realmente crítico em matéria da segurança e da tranquilidade necessárias a um bom ambiente educativo é as comunidades escolares e as suas direcções tomarem por normal e aceitável o que não é, em termos de comportamento individual e social.A demarcação do que é ou não é aceitável está inexoravelmente dependente, no contexto da sociedade actual, de um consenso entre todos os actores, desde que ele resulte de uma discussão aberta, livre e leal, algo que não está ainda instituído na nossa cultural organizacional, muito dada a compadrios, a tiranetes e a jogos de poder. Esta é uma questão relevante em matéria do desenvolvimento saudável da democracia, para evitar que ela se torne numa caricatura de si própria.O verdadeiro núcleo dos nossos problemas em matéria de educação reside na gestão e rentabilização dos recursos, no aumento da produtividade, no combate ao abandono escolar, no aumento da escolaridade e da literacia dos portugueses, em que a segurança é apenas uma das variáveis interferentes, estando todavia longe de ser, na nossa sociedade, das mais importantes. Começar a actuar antes que passe a ser parangona diária da imprensa, como já acontece noutros países da Europa, é uma medida avisada.

3 comentários:

Miguel Pinto disse...

“não entendo, nem as reacções de rejeição epidérmica a estas iniciativas legislativas que visam sistematizar o combate à degradação do clima na Escola,”
O problema é mesmo esse, Idalina. O problema são as iniciativas legislativas que são despoletadas por reacções epidérmicas às notícias bombásticas. De que nos valem iniciativas legislativas inócuas, redundantes (o conselho pedagógico pode constituir uma comissão de segurança), que muda o que importa, de facto, mudar: a relação de confiança entre os vários actores do sistema educativo?…

Miguel Pinto disse...

oppss... peço desculpa: [...] não alteram o que importa, de facto, alterar: a relação de confiança entre os vários actores do sistema educativo?…

Paideia disse...

Sim, Miguel, o problema é que em matéria de relações de confiança entre os actores do sistema, estamos irremediavelmente pré-determinados no que diz respeito à falta de confiança dos professores na actual equipa ministerial. Ou se procura perceber a natureza das propostas - e esta é uma iniciativa de uma comissão parlamentar, não da equipa governativa - e encará-las de forma crítica, ou então desata-se a dizer mal de toda e qualquer iniciativa, e isso eu não sou capaz de fazer. Portanto, penso que a iniciativa é virtualmente positiva, mais, vou escrever-lhes para que as coisas possam ser um pouco mais concretizadas. Não podemos é continuar a investigar a nossa realidade na perspectiva do "bullying", que é uma realidade diferente; temos que encontrar os nossos conceitos, as nossas categorias, as nossas variáveis, as nossas dimensões de cada variável. Investigar isto a sério exige recolha sistemática de dados e para recolher esses dados faltam instrumentos de recolha, de forma a sabermos que todos estamos a recolher as mesmas informações, por exemplo. No conselho pedagógico não me parece que se possa constituir uma comissão de segurança. Tem que ser num orgão que integre todos os intervenientes referidos na proposta, designadamente as forças policiais. E das duas uma: ou estas questões são para agendar em todas as escolas ou, pelo menos, numa amostra representativa, ou então poucas conclusões rigorosas podem ser tomadas.
Já está melhor, Miguel?