Da reflexividade docente, I: A escrita descritiva e a reflexão descritiva
A investigação em reflexividade docente tem procurado tipificar os vários níveis de reflexividade docente. Nesta área, investigam Hatton & Smit que, para categorizarem a reflexividade docente nas suas formas específicas, identificaram quatro níveis de reflexão:
Nível 1 - A escrita descritiva
Nível 2 - A reflexão descritiva
Nível 3 - A reflexão dialógica e
Nível 4 - A reflexão crítica
Nesta entrada, vou procurar caracterizar e exemplificar os dois primeiros tipos, através das mensagens que recolhi em fóruns de professores: 1)A escrita descritiva e 2) A reflexão descritiva.
Na sua essência, a escrita descritiva não é reflexiva, mas um tipo de escrita que inclui relatórios e literatura e descreve acontecimentos, sem procurar justificá-los. Um exemplo de escrita descritiva num fórum de professores:
«Em 2000 estive colocada em Mesão Frio, no meio de nenhures. Deram-me os 12ºs mais extraordinários da minha vida... Decidi, a propósito de Fernando Pessoa, que seria interessante usar o CD da Porto Editora. Foi a experiência mais psicadélica da minha vida. (…)»
O segundo nível de reflexão referido por Hatton & Smith, a reflexão descritiva procura explicações baseadas em opiniões pessoais ou na revisão de literatura; não se limita a descrever factos, mas procura justificá-los de forma descritiva ou narrativa. Reconhece e cita pontos de vista alternativos na literatura; pode assumir a forma de reflexão baseada numa posição teórica ou no reconhecimento de factores e perspectivas múltiplas. Um exemplo retirado de um fórum de professores:
«Versos balbuciei co’a voz da infância...», diz du Bocage, numa alusão à herança, da sua veia poética, do pai, da avó e de outras atávicas influências que o marcaram. (...) As TIC são, de facto, importantes no processo ensino-aprendizagem. Devem, no entanto, ser bebidas com o leite materno, que o mesmo é dizer, na infância e adolescência, sob risco, se assim não for, de desmotivar os jovens/adultos, por se não sentirem hábeis e destros, a lidar com elas. Efectivamente, as idades mais tenras espoletam a indiscrição, acirram a sagacidade, estimulam o talento, açulam o apetite. (…) Vemos adolescentes, ainda crianças, com destreza de pasmar, no domínio das TIC. A minha geração conviveu tardiamente com esta realidade. Esta relação serôdia atrofiou, naturalmente, o desejo, a vontade, o querer. No entanto, creio não ter de ser um exímio manuseador, para motivar os alunos, podendo uma boa pedagogia, um projecto interessante, uma ideia nova, intimamente conviver com essa técnica perfeita e tornar o resultado ainda mais extraordinário. Para além da evidente importância na interacção escola-família, permitindo a divulgação, a partilha, com os pais, de informações relativas aos seus educandos, outros benefícios ressaltam do uso das TIC: que aumentam a auto-estima; que estimulam a capacidade de investigar; que despertam a preocupação na apresentação estética de trabalhos; que promovem a aprendizagem independente; que permitem um maior e melhor manuseamento de informação; que desenvolvem destrezas; que... (Do latim se diz, por ser língua morta – leia-se já não falada por nenhum povo nem tão-pouco adoptada oficialmente pela Igreja – não ter utilidade o seu estudo, esquecendo, clamorosamente, todas as capacidades que a disciplina desenvolve, mormente destreza no raciocínio...). Mutatis mutandi, o mesmo acontece nas TIC. Ainda que outro mérito não tivessem, só pelos apontados valiam por si! Quais poetas barrocos, subornando à forma o conteúdo, corre-se o risco, dirão alguns, de se estar a promover o entretenimento, mais do qualquer outro aspecto pedagógico-didáctico desta componente. Não, não: não falamos de destro, embora isso também seja profícuo, na sua dimensão. O significante até será igual, no respeitante à imagem acústica da palavra; dizemos TIC, que não tique!... »
Neste exemplo encontramos justificações e explicações (“A minha geração conviveu tardiamente com esta realidade. Esta relação serôdia atrofiou, naturalmente, o desejo, a vontade, o querer.”), reconhecimento de perspectivas múltiplas (“corre-se o risco, dirão alguns, de se estar a promover o entretenimento”) e reflexões apoiadas numa posição teórica (“Efectivamente, as idades mais tenras espoletam a indiscrição, acirram a sagacidade, estimulam o talento, açulam o apetite.”).
terça-feira, setembro 11, 2007
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1 comentário:
olá!
Muito interessante este tópico.
Gostaria de saber onde posso encontrar mais pesquisas sobre este tema. Pois sou aluna do curso de Pedagogia da Universidade Do Estado de Minas - Brasil, e minha monografia é sóbre o tema da reflexividade docente. Principalmente sobre estes níveis de reflexidade sobre os quais você fala.
Agradeço se puder me ajudar!
Aline.
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