sábado, outubro 28, 2006


Modos de estar e de exercer

- Tens aí o telefone do AM? .
Isto, depois de uma prolongada espera da própria e do público que, de manhã, era numeroso.
Comecei por não gostar da terminologia em frente do público.
- Não, a minha relação com o Prof. AM é formal. Mas os contactos estão no sítio da UA.
Quem por isto passou, sabe do stresse que antecede a prova. Havia pessoas que tinham vindo do Algarve para assistir.
Subi 4 andares para ver se podia ser de utilidade, mas os contactos já estavam a ser estabelecidos.
A sua primeira preocupação: desmarcar o compromisso social da tarde (Idalina, só podes ser de Marte!). Vai marcando o número no telemóvel, enquanto me pede:
-Vais lá baixo à G. e perguntas-lhe se pode vir à tarde?
Noutras circunstâncias não teria qualquer problema em fazê-lo, trabalhamos em equipa, seria absolutamente normal. Mas nós somos o reverso de nós próprios, já percebi isso de tanto me auto-analisar. Deixo então, que o telemóvel comece a chamar o interlocutor, toco-lhe no braço levemente e digo-lhe baixinho:
- Parece-me melhor que sejas tu a falar com a G. Eu vou falar com a D.
Não seria sua obrigação ética lidar com a situação que criara e falar com ambas? Eu só pergunto, mas eu sou Marciana. Plink! Plink!
Desço quatro pisos. Componho o meu melhor sorriso, mas a boca parece fugir-me toda para o lado errado:
- O melhor é irmos almoçar, para voltarmos com mais energia. - A melhor forma que tenho de introduzir a notícia do previsível atraso de quatro horas.
FRANTIC será o termo exacto para a reacção?!? O caso não é para menos.
Ainda temos que mudar de sala. Transferimos equipamentos, comento com a funcionária a melhor luminosidade da sala, saímos. Preciso MESMO de me acalmar e de repor a boa disposição para transmitir ambas à minha menina. Olho em redor: o espaço e o dia cá fora ajudam. Telefono ao Jorge, aproveitamos para ir ao Centro de Arte Moderna, fico ainda mais irritada com a exposição do Cabrita Reis (matters don't seem to be improving, honey!).
O melhor é ver de um livro para oferecer à minha menina: Nem mais: “ O mar, o mar", de Íris Murdoch, a escritora irlandesa cuja imaginação fecunda produz uma narrativa poderosa e mágica. Bom, tem os seus momentos. Li-a no original, em Dublin e a tradução portuguesa, passada assim, em diagonal, parece-me bastante cuidada. Quando conversávamos animadamente - um Moscatel tinto é um relaxante inexcedível - surge a minha menina com o seu caranguejo verde. Apresento-lhe o meu capricórnio/peixe, comentamos a exposição, um pormenorzinho para o Halloween impele-me ao Corte Inglês e despedimo-nos até às 14.30. Quero chegar um pouquinho mais cedo para cumprimentar o nosso Arguente.que, ao todo, percorrerá hoje mais de 200 quilómetros para a função.
Quando regresso, a pessoa eu propusera para aquela missão, objectivamente uma visita nossa estava sozinha na sala. Nem na mais humilde e recôndita das escolinhas públicas portuguesas uma coisa destas seria sequer imaginável!Se há traços que distinguem o povo português, um deles é a hospitalidade.
Vem-me à memória o “Obviamente demito-o” do General Humberto Delgado. Terá sido por isso que foi assassinado. E que Sócrates (470 ou 469 a.C) bebeu o travo amargo. Eu sei. Eu sei. Eu sei. Paciência. Lá terei de sorver o meu. Convictamente.

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