sábado, março 15, 2008


Para bom entendedor, um modo verbal basta


A entrevista do Prof. Adriano Moreira a Mário Crespo foi bastante esclarecedora, não apenas pelo conjunto da mensagem, mas, e sobretudo, por algumas subtilezas. O Sr. Professor afirma que seria necessário um grande esforço para recuperar a confiança entre o Ministério da Educação e os seus tutelados.



Ora, um raciocínio não é uma mera questão de derivação sintáctica: é sobretudo uma questão de derivação semântica - construímos modelos mentais utilizando o significado das premissas e os conhecimentos gerais em que o modelo mental tem uma estrutura idêntica à da situação que ele representa.



A expressão condicional seria necessário implica diversas leituras:



. O grande esforço teria de ser feito;

. Sendo feito, nada garante que tivesse êxito, porque poderia ser percepcionado pelos intervenientes como não suficientemente grande ou suficientemente sincero, ou suficientemente justo para ambas as partes.



Em relação ao esforço a realizar, os factos apontam para uma ausência de vontade política em fazê-lo: o Partido Socialista marca um comício de desagravo uma semana a seguir à manifestação dos professores, o Dr. Vitalino Canas vem à televisão falar em "esquizofrenias de recuos", em que se arroga em único protagonista mentalmente são; a seguir, fala de um tempo para "esquecer os erros", quando já passou ao senso comum que reflectir sobre os erros é uma forma profícua de aprendizagem, que o porta-voz do governo entende não ser necessária; o Sr. Secretário de Estado Jorge Pedreira garante que a equipa do ME se mantém determinada num objectivo, quando já se percebeu que estamos perante uma autêntica caricatura de uma determinação que hora a hora se esfarrapa e esboroa em parêntesis, contingências e relativismos de contexto, em que o Sr. Secretário de Estado, com um ar de soldado sem campo de fuga, entrega o peito à espada inimiga e implora que o transformem em vítima, para não ficar na história como carrasco.



Em segundo lugar, mesmo que o esforço fosse feito, nada garante que viesse a ter êxito. E nada garante porque, tal como o Sr. Professor Adriano Moreira reconhece e afirma, qualquer entendimento entre duas partes se baseia na confiança mútua e ele próprio evidencia de várias formas que essa confiança dificilmente terá alguma hipótese de ser recuperada.



Essa recuperação é manifestamente impossível. Primeiro, do lado dos sindicatos, há uma mole de 100 000 pessoas, que é um capital jamais acumulado. Desbaratá-lo seria uma grande falta de habilidade política. Segundo, por parte das Escolas e dos professores, a equipa tutelar criou distâncias, mal-entendidos, humilhações, obstáculos comunicacionais de toda a ordem, para lá do aceitável ou recuperável.



Aquilo a que vamos assistir, porque o Sr. Primeiro Ministro não pode, neste momento perder a face, dispensando a equipa, será um lento, penoso, deteriorante, processo de não-diálogo que só contribuirá para atrasar os processos de decisão, que mais concorrerá para desacreditar esta equipa.


É um espectáculo deprimente e gerador de uma esquizofrenia identitária, porque afinal a equipa que tutela o Ministério da Educação é, também ela, constituída por professores que revelaram uma enorme distância transaccional com os seus interlocutores mais próximos – até neste aspecto o Prof. Adriano Moreira se demarcou, por um lado, ao criticar a existência da articulação comunicacional, cultural e procedimental e entre os ensinos superior e não-superior e, por outro lado, ao revelar que ainda faz parte de uma assembleia de uma escola secundária, constituindo-se assim a imagem viva da necessidade de os académicos conhecerem a realidade em que se movem, para não se alienarem.


(Declaração de princípios: esta não é uma verbalização da insatisfação em relação ao modelo de ensino - é apenas um convite à colega que tenha vergonha na cara e se demita)

1 comentário:

Teresa Martinho Marques disse...

Obrigada pelo carinho e palavras de apoio lá na Sala 16... Elas vão ficar felizes! Beijinhos