terça-feira, novembro 20, 2007



O F. está é muito deprimido
Vi-me de repente a pronunciar a frase no Conselho de Turma. O professor de História olhou-me como se a estranha afirmação fizesse, de repente, algum sentido, o professor de Religião e Moral manteve o seu ar fleumaticamente intrigado e a Directora de turma pronunciou algumas palavras de assombro ou dúvida, mas, ao mesmo tempo foi formulando algumas explicações para uma hipótese aparentemente absurda.
Mas sim, eu estou convicta de que o F. está deprimido.
Pode parecer disparatado falar de depressão acerca de um rapazinho de onze anos: há 25 anos acreditava-se que não fazia sentido falarmos de crianças deprimidas mas, actualmente, sabe-se que não é assim. Tal como se sabe que as crianças deprimidas enfrentam normalmente dificuldades escolares.
São vários os sinais de depressão juvenil, mas têm características diferentes da depressão nos adolescentes e nos adultos.
O jovem deprimido sente-se demasiadamente cansado para brincar ou estar com os companheiros, pode entrar em conflitos frequentes com os colegas, pode tornar-se no bobo da turma, com os seus ruidosos disparates, que acabam frequentemente na sua expusão da sala de aula.
A depressão infantil é difícil de caracterizar e de identificar, porque a imagem tradicional que temos de uma pessoa deprimida é de alguém triste, alheado, lento. Nos mais jovens, a depressão pode contudo ser acompanhada de outros sintomas, tais como a irritabilidade, a agitação e a cólera.
Nos adultos, o diagnóstico de depressão é feito com base em determinados sintomas como a tristeza, a falta de energia, consistentemente manifestados por um período de cerca de duas semanas.Nos mais jovens, os sintomas podem ser semelhantes, mas a intensidade, duração e os critérios de diagnóstico são diferentes.
Os sintomas de depressão podem manifestar-se igualmente num pensamento distorcido e irrealista, sentimentos de culpa, ansiedade, perda do prazer ou do interesse em actividades que habitualmente apreciam. Os mais jovens podem sofrer alterações de peso e de sono, dormem mais ou menos do que o habitual, podem registar alterações nos seus hábitos alimentares, podem tornar-se muito exigentes ou agitados, correr riscos excessivos ou despropositados e chegar mesmo a auto-infligir-se.
Kevin Stark, professor de psicologia educacional na Universidade do Texas, afirma que os professores e os pais têm dificuldade em identificar a depressão infantil, o que dificulta o diagnóstico e a intervenção.
A depressão tem contudo uma forte componente genética e os jovens depressivos costumam ter pais ou outros familiares com a mesma condição; todavia, o ambiente familiar e social podem ter a sua quota-parte no desencadeamento de episódios depressivos.
Os mais jovens com problemas de comportamento, ansiosos, obsessivos ou com dificuldades emocionais, estão sujeitos a episódios depressivos que podem persistir na idade adulta e influenciar negativamente a sua alegria de viver.
Na Escola, precisamos de desenvolver uma cultura que estimule os mais jovens a falarem dos seus problemas, de ter profissionais disponíveis para ouvir os alunos de forma consistente, em que eles ganhem confiança para poderem falar dos seus problemas pessoais, com quem aprendam a pensar de forma mais realista e positiva.

O F. está deprimido, sim. E precisa de ajuda. Sente-se irritado, está desinteressado, já pouco lhe importa que o proíbam de ir ao Clube do Mar, de que ele me falou com tanto entusiasmo quando foi admitido, percebe-se que anda a dormir mal, tem pesadelos, diz a mãe, pouco lhe interessa que o castiguem - fica no sofá a ver televisão - não manifesta interesse em brincar com os amigos, sente-se desesperado e impotente quando recebe uma avaliação desfavorável.
Para ele, neste momento, o mar está mais alto que a terra, o que o faz sentir-se um náufrago sem esperança.

4 comentários:

Maria Lisboa disse...

Se não houve qualquer modificação "intempestiva" na sua vida, se não há problemas graves no ambiente familiar, se não se viu desinserido repentinamente de um outro contexto, será de averiguar se não estará a ser vítima de bullying, dentro ou fora da escola... ou mesmo de qualquer outro tipo de assédio. Os sintomas reflectem-se da mesma forma.

Anónimo disse...

Nalguns das suas entradas revela possuir um conhecimento sólido de psicologia, embora não seja da área. Permita-me a pergunta: como é que adquiriu esse conhecimento? Por vontade própria, em função do mestradado e do doutoramento que realizou? Just curious...

Paideia disse...

Just curious...
Olá, PJ.
Fiz mestrado e doutoramento com uma psicóloga: a prof. Guilhermina Miranda. Fiz uma pós-graduação em ensino especial com outro psicólogo: o prof. Miranda Correia. Mas tb gosto de estudar. Faço-o todos os dias.
:)

Paideia disse...

Just curious...
Por outro lado, os conhecimentos não são assim tão sólidos: é mais o olhar... O F. é um rapazinho lindo, com um sorriso igualmente lindo e triste - é só pousar sobre ele um olhar empático.