domingo, março 25, 2007


A indisciplina instalou-se na nossa Escola


Cabe-nos a nós decidir se veio para ficar.

Ao que parece, a proposta de acção conjunta para controlo disciplinar emitida no Conselho Pedagógico não manifesta grande interesse na sua erradicação.

Se é verdade que considerou prioritário incidir sobre o não cumprimento de regras e das medidas disciplinares previstas, o que vem a seguir é uma verbosidade caudalosa que visa exacta e objectivamente o contrário.

Num documento extenso que teve de transitar para o Conselho Pedagógico do 3º. Período, afirma-se que é preciso "envolver os encarregados de educação". Mantemo-nos assim nos princípios sem qualquer tentativa de operacionalização. Envolver quem, como, quando?

A seguir estende-se num conjunto de pressuspostos, todos eles gizados no âmbito da gestão da sala de aula, ignorando ostensivamente uma questão essencial: os problemas mais graves situam-se fora da sala de aula e nas aulas de substituição.

No ponto B da proposta, regista-se a necessidade de "estratégias que podem ajudar a promover o envolvimento do Encarregado de Educação" - esta é a afirmação mais lapalissiana à face da terra. Não teria havido já oportunidade e tempo para fazer o levantamento sistemático de tais estratégias, de marcar uma reunião com os directores de turma, de decidir procedimentos sistemáticos e monitorizar a sua aplicação?

O documento diz ainda que não houve unanimidade no grupo de trabalho sobre a pertinência da tipificação dos comportamentos. Mas porque é que o grupo de trabalho não recolheu junto dos professores informação sobre o que eles consideram comportamentos graves, muito graves ou pouco graves? Tratava-se de uma recolha de dados que podia ter sido feita na modalidade de resposta aberta. Querem fazê-lo? Eu trabalho os dados com software de investigação qualitativa. Isto significa sem sombra de dúvida que, ou o grupo se fechou sobre si e sobre as suas contradições internas, ou há elementos do grupo apostados em que as coisas não evoluam.

O documento argumenta ainda que a classificação dos comportamentos tem de estar sujeita a factores de ponderação e indica factores de contexto. Isto não faz sentido nenhum. A qualificação dos comportamentos tem de ser objectiva e clara. Objectividade e clareza conseguem-se com uma contínua recolha de dados de observação e da respectiva ponderação, se possível através de um amplo consenso. Por exemplo, se o aluno chama "puta" à professora, o grau de gravidade tem de ser atribuído independentemente de quaisquer factores de contexto, quanto mais ainda colocados no plano especulativo, tipo "mas sabes, Idalina, é o que eles estão habituados a ouvir em casa...". A humilhação das mulheres é um factor que atravessa todos os estratos sociais. Em última análise, esta teoria dos factores de contexto introduz um grau de relativismo espistemológico absurdo e totalmente inadequado ao contexto educativo e à relação pedagógica.

Além disso, a situação de indisciplina e o clima de impunidade a que se chegou exige agora medidas mais estruturadas, que têm de ser aplicadas sistematica e consistentemente até que a situação possa recobrar alguma normalidade. Uma aluna do 6º. ano comentava um dia comigo: "Sabe, professora, é que os professores daqui têm medo dos pais". Ora aqui está uma manifestação das percepções dos alunos sobre ao ponto a que chegámos em matéria de disciplina.
Por outro lado, em matéria de indisciplina, o eterno recurso aos argumentos das condições sociais e familiares, mais uma vez utilizado neste documento, leva a situações inomináveis, tais como argumentar que um aluno não pode ser suspenso mais de um dia porque o pai afirma que ele está em risco de suicídio.

Como mãe, eu sei lidar com o risco do suicício como, por exemplo, passar noites inteiras de vigília ao presumível suicidário, sendo que se dividem as noites de vigília pelos recursos humanos da família; mas parece que querem fazer de nós parvos, ou disso fazer figura, quando não lhes ocorreu solicitarem uma declaração médica comprovativa do risco. Ou simplesmente aconselharem a família a confinar o rapaz e a sujeitá-lo a uma observação mais estrita durante o período de aplicação das medidas disciplinares. Querem saber como é que se faz? Eu conto. Dá muito trabalho à família, eu sei, mas é um bom treino para pais manipuladores. Como o menino a que me refiro exibe recursos que podem ser vendidos, ainda há a possibilidade de os vender para solicitar ajuda especializada.

Depois, chamou-me a atenção o completo desajustamento da solução preconizada da advertência e registo na caderneta do comportamento inadequado, claramente indiciadora de que o/ seu/sua subscritor/a não tem qualquer noção da real dimensão da indisciplina na escola.

É que, se os alunos ignoram ostensivamente os avisos de que não podem circular nos Blocos durante as aulas e se os advertimos, eles respondem "Mas quem é você para me estar a dar ordens?", se lhes pedimos a identificação, recusam-se a dá-la, quanto mais pedirmos-lhes a caderneta!

Temos de sair do primeiro andar e descer à Terra. Há directores de turma que recebem as participações e as ignoram liminarmente, como é o caso daquela turma do 7º. ano, que tem inúmeras participações escritas. Reuniram-se com os pais, é certo, mas a acção só pode ter sido mal conduzida, porque dias depois o disparate voltava em força.

E que medidas disciplinares foram tomadas no seguimento da inominável aula e substituição no 9º. B de 16 de Março?

O terceiro período aproxima-se e a situação agrava-se.

Finalmente, o documento revela uma alguma cedência aos que estão efectivavemte preocupados com a questão da indiciplina, enviando-lhes uma mensagem do tipo "AMANHEM-SE", ao afirmar que PODE haver um grupo de reflexão sobre a indisciplina. Muito agradecida. Count me in! Mas sugiro que o grupo inclua: docentes, não docentes e a Associação de Pais - sim, oiçamos mais as Associações de Pais, mas fora do contexto de um Conselho com carácter disciplinar em que a sua tendência é, naturalmente, para defender o aluno em julgamento.

A nossa Escola merece este esforço adicional, pelo muito de bom que ela ainda tem. Porque eu adoro a nossa Escola e não quero - ainda - desistir dela.

6 comentários:

so12 disse...

"suicidário"??????

Paideia disse...

sem tantos pontos de interrogação.

so12 disse...

:)) ok! Exclamo: viva o neologismo!!!! Boa Páscoa

Paideia disse...

Na paz do Senhor ressuscitado.

Maria Lisboa disse...

Sendo a minha escola "um pouco para o difícil" e pertencendo eu à secção de disciplina do CP, há dois ou três anos, elaborei (em conjunto com outra colega) um quadro de tipificação/gravidade de comportamentos e respectivas sanções. Não o posso considerar como uma bíblia (porque muitas vezes pode haver variáveis diversas, não enquadráveis num único ponto), nem um produto acabado, mas tem constituído uma boa base de trabalho e um nivelador/equilibrador das sanções a aplicar. Se quiseres posso fornecer o documento... pode servir de ponto de partida (ou de chegada ;), para o vosso trabalho)

so12 disse...

www.naoeshomem.blogs.sapo.pt
Aqui está toda a minha essência! :)) Não critico negativamente, apenas gosto de ler, aprender e divertir-me, como já dizia o filósofo!
Beijinhos