sexta-feira, novembro 10, 2006

(Neste Jardim à beira-mar plantado I, de João Garção)

Mais correspondência minha com Ruben Marks publicada no Diário de Notícias de hoje


Caro Ruben, reconheço que em matéria de conhecimento do sistema educativo sueco estou em desvantagem consigo. Vou então, estrategicamente, deslocar a discussão para latitudes em que a temperatura é um pouco mais amena. A situação da Educação em Portugal reflecte apenas o estado da sociedade portuguesa. Efeitos perversos do belíssimo acontecimento histórico de74, associados à democracia do sucesso dos anos 80 criaram em Portugal uma mentalidade de garantismo de direitos adquiridos que o fenómeno da globalização e as fragilidades estruturais do País estão a tsunamizar.
Esta filosofia do direito a tudo, da insuflação artificial da auto-estima, cimentada em literatura cor-de-rosa e cifrões (“Ó stôra, p’rakék’eu preciso dxtudari, s’o meu pai ganha mais c’à stôra a vender batatas?!?” - episódio autêntico) produziu uma geração de adultos, pais e professores, que não sabem muito bem como educar a sua juventude, o que é trágico. Somos ainda todos Altamente Especializados na profissão dos outros, mas deploravelmente incompetentes, negligentes e Salazarentamente Soberbos na nossa.
Dou-lhe ainda toda a razão, Ruben, quando afirma que os menos responsáveis são os meninos e que há figuras que um professor simplesmente não deve permitir-se fazer, como chamar nomes à sua Ministra em público, o que não o impede de se manifestar civicamente: a modelação é importante em educação. O problema é que, durante todo o Verão, foi orquestrada contra os professores uma campanha de denegrição para preparar medidas que inevitavelmente tinham de ser tomadas. Do ponto de vista da autoridade natural do adulto cuidador que o jovem deve ter como princípio essencial foi lastimável.
O insulto é um caminho perigoso e sem retorno, os comportamentos modelam-se e a sabedoria portuguesa avisa que quem com ferros mata, com ferros há-de morrer.
Bem-haja por debater estes temas, Ruben. Há muito para debater e o Ruben já é, afinal, um dos nossos. Por exemplo, não é verdade que, ao terminar uma licenciatura, alguém esteja preparado para a docência. Aliás, estamos com sérios problemas na formação inicial dos docentes, diagnosticados por diversos estudos e pela evidência empírica: os jovens candidatos a professores não sabem, por exemplo, explicar a essência da sua função. Por outro lado, a progressão fundamentada na avaliação do desempenho parece-me um princípio mais razoável que a progressão automática, mas sobre esta matéria a Lei tem monstruosidades que nos levam a pensar em exportar legisladores para a Sibéria ou para o Alaska, onde causarão menos estrago, mas a responsável política pela sua publicação é a Sra. Ministra.Por aqui me fico hoje. Até breve, Ruben.

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