quarta-feira, fevereiro 28, 2007


Acabou a aula a chorar

Já a conheço há aaaanos, sempre com o mesmo ar pachorrento. Outro dia perguntou-me como é que eu conseguia “segurar” a turma. Mas fê-lo com um seu ar eternamente paciente e eu não dei muita importância. Comentei que já toda a gente sabia que ela era particularmente benevolente, do mesmo modo que todos sabem que eu não sou “boa de assoar”.
As coisas parecem ter piorado. Por princípio, a cultura dominante é que um professor tem de saber manter a disciplina na sala de aula. Ninguém sabe muito bem como é que cada um faz. Actuamos todos como se não houvesse nada para discutir, experiências para cotejar, como se, quem não consegue manter a disciplina, é porque é fraco ou inepto.
Uma das representações dominantes sobre a condição docente é a de que se trata de uma profissão altamente stressante: um estudo internacional de 2000 revela que 40% dos professores inquiridos tinham ido ao médico durante o ano anterior por razões associadas a stress e problemas de saúde afins, tais como hipertensão, insónia, problemas gastrointestinais, depressão e comportamentos aditivos, designadamente consumo de álcool e de medicamentos.
Os factores de stress nos professores prendem-se com aspectos intrínsecos ao ensino, factores cognitivos e factores sistémicos de natureza institucional e política.
Um aspecto curioso prende-se com as alturas do ano: se é verdade que o fim-de-semana parece ser suficiente para recuperarmos durante a Primavera, o mesmo não acontece durante o Inverno. De entre os factores intrínsecos, a gestão da disciplina na sala de aula vem à cabeça
(Lewis, 1999; Morton et al, 1997): verificou-se uma elevada correlação entre elevados níveis de stress e a percepção de incapacidade – ou impotência - para manter a disciplina. Por outro lado a manutenção da disciplina é o único factor de stress que não diminui ao longo da carreira. Curioso, não?

Outro factor que influencia os níveis de stress é a forma como as professores encaram as suas obrigações, isto é, o grau de responsabilidade que se atribuem quer nos resultados escolares dos alunos, quer na forma como estes se comportam. Quanto mais um professor atribui a si próprio a responsabilidade dos fracassos, maior é a sua vulnerabilidade ao stress.
Depois, é o silêncio pesado que se abate sobre o assunto, o recusarmo-nos a falar disso, a admitir as nossas fragilidades, a solidão e o medo do que os outros vão pensar se acusarmos fraqueza. Para mim, isto é o pior de tudo, porque nos deixa sós com a nossa angústia, nos impede de a partilhar, de falar abertamente sobre os problemas e de os enfrentar colectivamente.

É que já bastavam os factores de natureza sistémica: esta mudança contínua de rotinas, procedimentos, currículos, este clima social de um governo apostado em desmoralizar os professores.
Estou em crer que entre as formas mais eficazes de lidarmos com estes factores consiste em apoiarmo-nos mutuamente e em sermos apoiados pela direcção da Escola.
Pelo menos, a “Senhora dos cabelos brancos” foi ter uma conversa com os nossos “terroristas”. Vamos ver o que, no conselho de turma, conseguimos fazer connosco, se nos damos a oportunidade de mutuamente nos ajudarmos. Talvez ela não volte a chorar e a mim, a tensão me suba menos.

2 comentários:

Cristina disse...

Idalina,

Esta questão do isolamento dos professores é a grande pedra de toque, não há dúvida. Como colega da mesma Escola, sinto que temos de começar a mudar a situação. Fiz uma proposta de encontros informais regulares nas quartas feiras em que não existem reuniões marcadas, para troca de experiências e desabafos. Ficou registada na tal Comissão que quer actuar sobre a Indisciplina, como se isso não fosse um problema de Escola - que só se resolve rompendo com o isolamento dos professores. Mas como mudar mentalidades e fomentar o verdadeiro trabalho de equipa que lidará, de vez, com a Indisciplina que põe os professores em Stress?? Também ando stressada, mas não me importo de pedir ajuda - mesmo que a resposta tenha sido: "Isso é um problema das aulas de Inglês, pareces uma professoras estagiária!"
Assim, não vamos lá.

Paideia disse...

Pois, é como dizes Cristina: isso é sempre um problema dos outros. Contudo, nas Escolas também há psicólogos que poderiam ajudar a mudar mentalidades, certo?