Diagnóstico: Síndrome de Asperger
... E de súbito um olhar que nos pede compreensão e paciência e volta a fugir num ápice:
- Porque não me olhas quando te falo?!
- Por respeito…
Um rosto menino e redondo, de uns verdes dez anos e um sorriso breve que mal aflora nos olhos que já riem para mim, me procuram e espreitam à entrada da Escola, quando os meus horários e rotinas já estão minuciosamente estudados e decorados.
- Queres ler hoje?
- Sinto-me um pouco “embaraçado”…
Um primor linguístico para quem ainda gagueja de timidez e de ansiedade social.
- Mas tens tão boa pronúncia…
(Uma luz de um Sol acolhedor que se abre num sorriso de olhos-e-boca só para o meu dia!)
Dos muitos meninos que por mim passaram e por quem passei foram certamente estes os que menos compreendi e menos ajudei. É por isso que invisto nesta criança, tão inteligente e tão só, as minhas expectativas, a minha energia, o meu saber de muitas reflexões e emoções – e algum sofrimento ainda.
Ele gosta muito de biomas e eu também. Assim, temos sempre o nosso assunto secreto a que podemos regressar, um espaço que é só nosso, de ursos do Alasca, cães da pradaria e zebras da savana. Também gosta muito de mecanismos, por isso ganhou o seu lugar junto do meu (e vice-versa, como veremos adiante), onde me ajuda com retroprojectores, computadores, data shows e leitores de CD’s: sim, porque eu sou um bocadinho mal-asada em matéria de máquinas, como vocês já compreenderam…
Mas não pensem que este território secreto foi fácil de alcançar: no início do ano, ele sentava-se lá no fim da sala e, de vez em quando, escondia-se debaixo ou mesmo atrás da mesa, depois de a virar de lado, como uma trincheira, e eu tinha de me ir lá sentar com ele, com o meu caderno de armistício em punho, para lhe ouvir as reivindicações e entrarmos em negociações, os dois com ar muito compenetrado. Aliás, desejávamos ambos ardentemente chegar a bom termo. Quem é que, afinal, não deseja ser amado e compreendido? E mostrar que, às vezes, também sabe fazê-lo?
quarta-feira, agosto 29, 2007
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